DISCURSO DE
POSSE DE RENÃ LEITE PONTES NA PRESIDÊNCIA DA ACADEMIA DOS POETAS ACREANOS
SAUDAÇÃO
Presidente da
Academia dos Poetas Mauro Modesto; Presidente da Academia Acreana de Letras
Dra. Luísa Karlberg; Presidente da Academia Juvenil Acreana de Letras Jackson
Viana; Confrade Moisés Diniz, da Academia do Juruá; Confrade Alessandro Borges,
da Academia da Baixada; professoras que nesta noite são homenageadas; minhas
senhoras, meus senhores.
DISCURSO
Quiseram os
astros e este Sodalício que eu ocupasse, hoje, por escrutínio secreto, a
presidência da Academia dos Poetas Acreanos, cargo de representação cultural,
ocupado apenas por seu fundador e único Presidente, o economista e poeta Mauro
D’ Ávila Modesto da Costa, alma acreana, escritor, ex-presidente da Academia
Acreana de Letras; amigo de Raquel de Queiroz, Austregésilo de Athayde e
Francisco da Silva Nobre; com assento em diversas academias do Rio de Janeiro,
Rio Grande do Sul e laureado pelas Academias da França e Portugal; fundador da
Fundação Garibaldi Brasil e Fundação Municipal de Cultura e Desporto de Sena
Madureira. Na sua vida pública, serviu como assessor especial de quatro
governadores; publicou 11 livros, fundou a Casa do Poeta Acreano e a Academia
de Jornalismo; fundou a Federação das Academias de Letras e Artes do Estado do
Acre e o Instituto Brasileiro de Culturas Internacionais, seção Acre.
Nos municípios,
fundou as Academias de Letras e Artes de Assis Brasil, Sena Madureira, Xapuri,
Brasileia, Plácido de Castro e Senador Guiomard, ocasião em que conferiu a
minha mãe, a Professora Raimunda Nonata Leite, o patronato da cadeira de número
11 da Academia de Letras e Artes da terra onde nasci.
Ao Presidente
que sai com sua Diretoria, expresso o reconhecimento do trabalho desinteressado
que dispensaram à nossa terra e nossa gente. Expresso também a gratidão ao
Sodalício, pela confiança em me eleger e de passar às minhas mãos a Presidência
desta augusta casa de cultura e saber.
Este evento
especial de posse representa os valores da transição democrática que - com
nossa contribuição - tem sustentado em oitavas ascendentes, a cultura poética
do nosso estado. Somos uma associação de pessoas, nos termos da Constituição da
República, reunidas por livre iniciativa, para reclamar a representatividade
das letras versificadas do nosso Estado, cultivando um espaço cultural firmado
e reconhecido como Academia dos Poetas Acreanos, ou palco sagrado da poesia -
intangível fonte de isonomia de direitos entre acadêmicos, amantes da poesia e
profissionais das mais diversas áreas de atuação e saber, com extensão a todos
os estudantes e cidadãos do Estado do Acre.
Neste instante
em que aqui estamos reunidos, nossos semelhantes esperam por nossa ajuda e
trabalho no campo da cooperação e do altruísmo. Não seria exagerado afirmar que
a ausência dos Valores éticos e morais são a “causa causorum” dos problemas
sociais que desvirtuam o conceito de sociedade, estado, família e escola.
Os problemas
sociais modernos vão do destino incorreto do esgoto urbano à poluição dos
mananciais; do desemprego que tanta angústia causa a juventude à insegurança
urbana e rural; vão da corrupção pública à falta de investimentos necessários a
educação básica, esta última, acesso preferencial para condução da nossa
sociedade em crise, a um patamar superior de civilização.
Neste contexto,
a Academia dos Poetas tem um papel importante, por abrigar os próceres das
letras poéticas do Acre, que em teoria, amalgamam o substrato gnosiológico da
poesia e as altas habilidades da leitura, escrita e oratória, enfim,
competências necessárias ao exercício da cidadania e porta de acesso garantido
ao mundo do trabalho, que reclama cada vez mais dos jovens trabalhadores o
domínio das habilidades da leitura e escrita.
Necessitamos
compreender que, independente do idioma ou país onde foi concebida, a poesia é
um legado universal do gênio humano, desde os primórdios da humanidade,
pairando acima de meras questões de natureza material, territorial e
idiomática. Segundo a teoria literária, a poesia como forma de arte pode ser
anterior à escrita. Muitas obras antigas, desde os vedas indianos (1700-1200
a.C.) e os Gathas de Zoroastro (1200-900 aC), até a Odisseia (800 - 675 a.C.),
parecem ter sido compostas em forma poética para ajudar a memorização e a
transmissão oral nas sociedades antigas. A poesia aparece entre os primeiros
registros da maioria das culturas letradas, com fragmentos poéticos encontrados
em antigos monolitos, pedras rúnicas e estelas.
Os grandes
gênios da História quiseram e foram reconhecidos como poetas, a exemplo de
Homero, Virgílio, Aristóteles, Dante, Goethe, Beethoven, Salomão... As obras
dos reformistas e as próprias Bíblias do planeta Terra: os Edas germanos; Os
Hinários Indianos, chineses, húngaros, japoneses, alemães; o Talmud; os
Evangelhos de Chilam Balam de Chumayel; o Bagavat Gita (o Canto do Senhor); o
Alcorão Islãmico; A Biblia Hebraica, organizada em capítulos e versos
(versículos), alinhavando Salmos; os poemas da Divina Comédia de Dante em teza
rima ou terça rima - forma poética dificílima que antecipa nas estrofes o som
que irá ecoar por duas vezes no terceto seguinte, parecem querer nos chamar
atenção para uma possibilidade de beleza superior e existência de um patamar
mais elevado de organização poética associada a uma lógica de estatura proporcional
a aristotélica, que segundo Kant, não sofreu adição ou correção significativa
durante dois milênios.
Segundo um
manuscrito depositado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo de Lisboa, a
Epopeia de Gilgamesh, um poema épico, é o poema mais antigo de que se tem
notícia, foi escrito em escrita cuneiforme em tabletes de argila e,
posteriormente, em papiro, no terceiro milênio a.C. na Suméria, Mesopotâmia
(atual Iraque). Podemos encontrar outras poesias muito antigas nos épicos
gregos Ilíada e Odisseia, nos livros iranianos antigos Gathas Avesta e Yasna e
ainda no épico nacional romano Eneida, e nos épicos indianos Ramayana e
Mahabharata.
A poesia, ou
texto lírico, é uma das sete artes tradicionais, pela qual a linguagem humana é
utilizada com fins estéticos, ou seja, ela retrata algo em que o amor, o belo,
a morte, o drama, a tragédia, a comédia e a catástrofe, enfim, podem acontecer
dependendo da harmonia da imaginação e capacidade de catarse provocada no
leitor pela intenção (ou não) do autor. O poema pode ser definido como a obra
feita através da poesia, o motivo do poema, sua causa imaterial e inspiração é
a poesia. Ao artífice da poesia, aquele que escreve, canta e declama poesia,
denominamo-lo de poeta.
Já os poetas são
cidadãos geralmente emancipados ou desapegados materialmente por vislumbrarem
algo além do seu tempo, objetivam dedicar-se a segurança e proteção cultural
das suas localidades. Vejamos alguns casos:
A História dá
conta de que lutaram por Helena de Tróia dois impérios, o grego e o troiano,
dois estados, em uma guerra de dez anos que recrutou titãs como o myrmidon
Aquiles e o mortal Heitor, além dos monarcas dos reinos interessados e seus
exércitos. Mas Helena era mortal, e assim ficou velha e adoeceu e perdeu a
beleza. Se não fora o poeta Homero a eternizá-la em verso ao cabo de alguns
séculos após, Helena jamais teria passado para o inconsciente coletivo
terrestre e se mantido bela até nossos dias.
No famoso
episódio da vinda de D. João VI para o Brasil em 1808, não querendo o monarca
ficar distante da arte, dos literatos e da poesia, encarregou o Ministro de
Estado Antônio de Araújo de Azevedo, o Conde da Barca, para contratar um grupo
de poetas, artistas e artífices na Europa para fundar, no Rio de Janeiro, uma
escola ou instituto teórico-prático de aprendizagem artística e
técnico-profissional - a famosa Missão Francesa de 1816. Assim nasceu, por se
fazer necessária, a arte e a poesia no Brasil como hoje a concebemos.
Outro caso
curioso envolveu a Torre Eiffel. Pouco tempo após sua construção em 1889, uma
elite fisiológica francesa alegando a defesa do bom gosto francês, apelidaram a
Torre Eifel de “torre de babel” e propuseram livrar o “Champ de Mars” da sua
incômoda presença. Se não fosse a intervenção dos poetas visionários e demais
artistas franceses da época, o monumento pago mais visitado do mundo, desde a
sua fundação, teria sido desmontado e vendido como simples sucata para um ferro
velho.
Não é demais
destacar aqui um detalhe importante da revolução acreana, na etapa de 1900, a
famosa expedição dos letrados que, com a simpatia do governador do Amazonas
Silvério Néri, decidiram organizar a "Expedição Floriano Peixoto",
batizada de "Expedição dos Poetas", devido ao elevado número de
jornalistas, poetas e versejadores que dela fizeram parte, tais como Dom
Epaminondas Jacome, Vitor Francisco Gonçalves e Trajano Chacon... que
ambicionavam ajudar a proclamar a Segunda República do Acre. Não obstante o
malogro da missão poética quando, recém-chegados ao Acre, a bordo do vapor "Solimões",
em dezembro de 1900, foram dispersados, em um episódio cômico, a tiros pela
guarnição boliviana de Puerto Alonso. Todavia, se a expedição dos poetas não
ajudou com armas àquela etapa da revolução, o fez com importante divulgação da
causa acreana nos principais jornais de Belém, Manaus Rio de Janeiro e São
Paulo.
Gostaria de
deixar claro a este honorável auditório, em nome da nova Diretoria, que estamos
cientes dos desafios e limitações que virão, porém dispostos a fazer tudo
aquilo que for dignificante, justo e bom para levar a poesia a quem mais
precisa, defendendo o idioma pátrio, preservando e multiplicando o tesouro
poético-literário do estado do Acre.
Nos termos da
IWA, pretendemos incentivar os jovens talentos a publicação das suas obras,
elevando a Literatura local que nos ajudará a sobrepor o otimismo sobre o
pessimismo, o incentivo sobre a crítica, a valorização sobre a indiferença,
enfim, a fraternidade sobre a divisão.
Embora sem
recursos, conta bancária, nem instalações físicas onde possamos guardar o Livro
Ata desta posse, não daremos lugar ao pessimismo, mas sim, a esperança ao invés
do desalento; a prontidão ao invés da inércia; a alegria e a tolerância as
individualidades ao invés da aridez de apontar defeitos; o diálogo humilde ao
invés da negação do outro; priorizaremos o coletivo sobre o egoísmo; a beleza
ao invés do descuido; enfim, seremos observadores da razão ao invés da fé cega
e irracionalidade.
Por fim,
agradeço ao Tribunal de Justiça do Estado do Acre, seus funcionários e demais
visionários acreanos, cuja capacidade de percepção e senso valorizador da
importância da poesia acreana financiaram nossa roda de poesia até os nossos
dias, contribuindo para que a poesia acreana ocupasse um espaço no cenário
nacional e internacional.
Me despeço aqui
com um soneto porque nos eventos desta casa, não pode não haver poesia.
Muito obrigado
SETE ANOS DE
PASTOR
Paráfrase de
soneto de Camões
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Por Renã Leite
Pontes
Sete anos de
pastor Jacó servia
qual neto
dedicado de Abraão;
querendo a bela
filha da sua tia
e, por amar
Raquel, não disse não.
Dois, sete anos,
passou... chegou o dia.
Jacó foi ver
Raquel e, ao recebê-la,
de pronto
percebeu, não era ela
que o pai,
fazendo logro, não daria.
Mas como o bom
pastor bom filho fora
do potentado
Isaque e uma pastora
caiu do céu a
ajuda merecida.
Conforme Deus
nos outros sete anos
não houve margem
para mais enganos:
quem não sofre
no amor não goza a vida!